quinta-feira, 24 de março de 2016

Brasil Colonial era um grande foco de epidemias


Brasil Colonial era um grande foco de epidemias

POSTAGEM DE 23 DE MARÇO DE 2016 ΙΣΤΟΡΊΑ NOSSA CAMINHADA   

Prof. José Cícero Gomes, para ΙΣΤΟΡΊΑ NOSSA CAMINHADA.
Havia um distanciamento enorme entre os lusitanos e seus parentes que vinham se aventura no Brasil ou estavam aqui em degredo. Pois o trajeto de Lisboa ao Brasil era muito difícil, insalubre e mortífero para velhos, crianças e quem tivesse a saúde fragilizada. Viajar em mares nunca d’antes navegado não era para qualquer um. Assim as dificuldades e os perigos faziam com que o Brasil fosse pouco visitado nos séculos XVI, XVII e XVIII.

A SOCIEDADE LUSO-BRASILEIRA, SUAS DOENÇAS E CONDIÇÕES SANITÁRIAS.

Os portugueses quando aqui chegaram, em 1500, encontraram uma grande população indígena que viviam de maneira seminômade que possuía uma cultura pouco heterogênea em termos culturais e linguísticos. Tupis-guaranis, tapuias, goitacases, aimorés e outras etnias se dispersavam pelo litoral e o interior. É bom lembramos que aqui abaixo do Equador não havia muitas das doenças virais e bacterianas existente no velho mundo. Entre as doenças de que sofriam os indígenas no principio da colonização portuguesa no Brasil, o historiador Lourival Ribeiro (1971) cita as “febres[1]”, as disenterias, as dermatoses, os pleurises[2] e o bócio endêmico[3] como sendo as moléstias[4] prevalentes entre os indígenas. Passado o período de exploração da costa, cuja principal atividade econômica era a extração do pau-brasil, a Coroa portuguesa inicia, com a expedição de Martim Afonso de Souza (1530-1533), o processo de colonização e ocupação territorial. Esse período foi marcado pela exaltação da natureza brasileira. Parecia que a doença raramente afligia os habitantes da América. O certo é que, ao findar o período colonial, os poucos índios que viviam sob o domínio português eram pertencentes ao último escalão da sociedade. A escravização e a matança, iniciadas com a captura ou desocupação de terras, contribuíram menos que as doenças importadas para o que os historiadores chamam de catástrofe demográfica da população indígena (Silvia, 1991). Os índios foram vítimas de doenças como sarampo, varíola, rubéola, escarlatina, tuberculose, febre tifoide, malária, disenteria, gripe, trazidas pelos colonizadores europeus, para as quais não tinham defesa imunológica.[5] Junto com os escravos africanos, aportou também um novo tipo de malária[6] em solo americano.
A grande maioria dos agentes patológicos[7] veio abordo das naus lusitanas e aqui desembarcavam na cidade de Recife, Salvador e Rio de Janeiro, e logo encontravam um ambiente propício para se proliferassem devido os maus âmbitos de higiene dos próprios colonos portugueses e dos nascidos na terra, os luso-brasileiros (filhos de pai e mãe lusitanos mas nascidos no Brasil). Vários Zé ninguéns também herdaram os maus âmbitos higiênicos dos portugueses. Quem eram os Zé ninguéns que nunca foram vistos como portugueses? Esses eram os filhos bastardos dos colonos portugueses com mulheres indígenas ou com escravas africanas com, esses quando incorporados na vida urbana não eram menos desprovidos de âmbitos de limpeza do que os autênticos lusitanos. Era algo bem comum, na cidade de São Sebastião do Rio, na cidade São Salvador da Bahia de Todos os Santos ou em qualquer outro núcleo urbano brasileiro colonial, um transeunte era “atingido” por excrementos humanos voadores enquanto seguia pela rua. Não havia esgoto, e o hábito era jogar o resíduo pela janela mesmo. As ruas, claro, não ficavam exatamente limpas, e se tornavam bastante insalubres[8]. Não tendo na colônia nenhuma faculdade de medicina, doenças contagiosas chegavam e ficavam sem e se proliferavam[9] com facilidade porque não havia resistência por falta de médicos e medicamentos eficazes.  Mesmo nos últimos dias da década de 90 do século XVIII, já muito próximo do fim do período colonial e da chegada da família real portuguesa em fuga para o Brasil, a colônia portuguesa na América do Sul, digo o Brasil, já com uma população estimada em cerca de 3 milhões de habitantes, não tinha mais de 12 médicos formados para atender os luso-brasileiros, é bom lembramos que todos eram importados. Por tudo isso, a expectativa de vida era muito curta. Era uma raridade os indivíduos que passavam dos 30 anos. As Crianças eram vítimas fáceis: nos séculos XVII e XVIII, por exemplo, apenas uma em cada três crianças nascidas nas áreas urbanizadas da colônia portuguesa conseguia sobreviver.

A pólvora como medicamento[10]
Escassos também em Portugal, os físicos eram mandados Dentre medidas hoje consideradas curiosas, como o acendimento de fogueiras, a expulsão das meretrizes da cidade
Mesmo quando o paciente sendo um sujeito abastado ainda precisava conta com a sorte porque ter riqueza não era garantia de conseguir assistência médica profissional, sua situação não era das melhores – os médicos também não sabiam muito bem o que estavam fazendo. Para termos uma ideia da medicina praticada no mundo colonial português no final do século XVII, vamos lembrar o médico português João Ferreira Rosa, que veio ao Pernambuco em caráter excepcional, devido a grande epidemia de febre amarela que assolava a cidade de Recife. Em 1690, o médico João Ferreira Rosa, mediante o contrato de uma pensão de 20 mil réis e uma ajuda de custo de 50 mil réis, apresentou as regras para uma campanha considerada como a primeira de caráter profilático[11] das Américas, do alto do seu reconhecimento como um médico[12] renomado que veio fazer parte dos poucos profissionais de saúde da colônia, recomendou, entre outras coisas, a expulsão das prostitutas. Segundo ele, elas ofendiam a Deus, que poderia querer se vingar. Além da expulsão das prostitutas e a emanação de tiros de canhão para afugentar a epidemia, o médico também ordenou medidas higiênicas que resultaram no enfraquecimento gradativo do mal. Os remédios daquela época, aliás, frequentemente envolviam ingredientes como fumo, fezes de cavalo, aguardente e, está documentado, pólvora. Imagine o alvoroço que isso tudo não causava no organismo do vivente, acabando por fazer muito mais mal do que bem. Ou seja, mesmo com a chegada da Corte ao país em 1808 e a criação de duas faculdades de medicina por aqui (uma em Salvador e outra no Rio), a saúde pública no país não melhorou muito. A própria expectativa de vida só viria a subir significativamente no século XX.  



[1] med elevação da temperatura corporal acima de 37o C; pirexia.
[2] Med pleurises o mesmo que pleurisa. Pleurisia ou pleurite é uma inflamação das pleuras pulmonares (parietal e visceral) que pode ser seca ou com aumento do líquido pleural (derrame pleural).
[3] O bócio endêmico ou carencial corresponde a um aumento de tamanho da tireoide, formando um inchaço no pescoço, também chamado de papo.
[4] Disfunção orgânica, ger. manifestada por uma série de sintomas; mal, doença, enfermidade.
[5] O sistema imunológico: (tambem conhecido como sistema imunitário) é a defesa do organismo contra organismos infecciosos e outros invasores. (anticorpos ou defesas naturais que imunizam contra doenças).
[6] Malária, Doença infecciosa febril aguda causada por parasita unicelular, caracterizada por febre alta acompanhada de calafrios, suores e cefaleia, que ocorrem em padrões cíclicos, a depender da espécie de parasita infectante. Nomes populares: Paludismo, impaludismo, febre palustre, febre intermitente, febre terçã benigna e maligna, maleita, sezão, tremedeira ou batedeira.
[7] Um agente patogénico ou agente patogênico, também chamado de agente infeccioso ou etiológico animado, é um organismo, microscópico ou não, capaz de produzir doenças infecciosas aos seus hospedeiros sempre que estejam em circunstâncias favoráveis, inclusive do meio ambiente. Podem ser bactérias, vírus, protozoários, fungos ou helmintos. O agente patogênico pode se multiplicar no organismo do seu hospedeiro, podendo causar infecções e outras complicações.
[8] (insalubre) pouco saudável, capaz de provocar doenças.
[9] Pretérito imperfeito do verbo proliferar.  Para medicina é multiplicar-se rapidamente; propagar-se, espalhar-se.
[10] Substância ou preparado us. no tratamento de uma afecção ou de uma manifestação mórbida; medicação, remédio, fármaco.  
[11] O termo "profilático" vem de profilaxia, do grego prophýlaxis = cautela. Profilático refere-se a profilaxia e significa preventivo, sendo utilizado para designar algo capaz de prevenir ou atenuar determinada doença (medidas/ações profiláticas, tratamento profilático). Profilaxia pode ser definida como sendo um conjunto de medidas que visam prevenir, em nível populacional, uma doença.
[12] O médico é aquele que detém os conhecimentos da medicina e pode exercer o tratamento medico em busca da cura de uma doença ou de sua prevenção. Médico prático é aquele que exerce a profissão de médico sem ter a formação acadêmica. Ele aprendeu a arte de curar com algum médico credenciado e se submeteu aos exames que o permitem atuar. Esta situação foi comum no século XIX no Brasil.

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FONTES BIBLIOGRAFICAS


EDLER, Flavio Coelho. Saber Médico e poder profissional: do contexto luso-brasileiro ao Brasil Império. SP: 2000.
FOUCAULT, M. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. São Paulo:
Ed. Martins Fontes, 1999.
GURGEL,Profa. Dra. Cristina Brandt Friedrich Martin  Grupo de Estudos História das Ciências da Saúde FCM, Unicamp. São Paulo: 2012.
WEHLING, Arno. Fundamentos e Virtualidades da Epistemologia da História: Algumas questões. Estudos Históricos, v. 5, n. 10, p. 147-169, 1992. Disponível em , acesso em 24.07.2008.